Sinopse:
É precisamente neste livro escrito em 1863 e cuja acção se situa em
Paris no ano de 1960, que Jules Verne se afirma como um romancista de
antecipação. A visão contrastada de uma civilização urbana, ao mesmo
tempo admirável pela sua tecnologia e totalmente “desculturizada”, é a
chave deste romance negro que nos dá a exacta medida do fabuloso talento
de um dos maiores romancistas de todos os tempos.
Opinião (audiobook):
Julgo que esta será a primeira vez em que um livro cujas personagens são tão fracas me consegue cativar simplesmente pelo mundo que apresenta.
Nunca tinha lido nada da autoria de Jules Verne (mais conhecido por cá como Júlio Verne), embora como quase toda a gente conheça o seu trabalho, seja por filmes (reais e animados) seja pela influência que os seus trabalhos tiveram noutras artes e que se vêem um pouco por todo o lado.
Daí que tenha partido para esta leitura ignorante do estilo do autor, se bem que consciente da genialidade do mesmo.
Em termos narrativos posso dizer que a história nada tem de especial. O enredo é simples e sem grandes acontecimentos, além de a trama estar contada num tom algo plácido que cria um distanciamento entre o leitor e a acção (por pouca que esta seja). Temos um comum sonhador, um poeta num futuro em que as letras estão mortas e os artistas morrem de fome.
Não posso no entanto dizer que a história em si é desprovida de interesse, pois são os acontecimentos que permitem ao leitor ver o mundo que Jules Verne imaginou.
Pessoalmente fiquei surpreendida com o final, não por ser inesperado, mas porque em parte não acreditava que o autor fosse por esse caminho.
Por outro lado o mundo que o autor nos apresenta é rico em detalhes, pensado ao pormenor e estranhamente verossímil. Jules Verne pode ter-se baseado nas descobertas do seu tempo para criar este futuro distópico em que as artes mirram frente ao progresso industrial, mas a verdade é que só uma mente brilhante poderia ter imaginado tal cenário há mais de 100 anos atrás.Muitos poderão argumentar que a visão futurista do autor nada tem a ver com a realidade de hoje, mas será essa a verdade? A indústria não cresce de forma exponencial? O que se faz hoje em dia sem recurso à energia (eléctrica ou outra)? As cidades não se estendem até ao infinito, quase sem o vislumbre da natureza? Não temos nós alguns dos Invernos mais rigorosos dos últimos séculos e não estão as pessoas mais preocupadas com os lucros do que com as artes?
Em muitos pontos a visão de Jules Verne falhou (a literatura não só não desapareceu, como está cada vez mais abrangente e chega a todo o lado), mas talvez na altura em que escreveu o livro (1863) as perspectivas não fossem muito animadoras aos olhos do autor.
O mundo que Jules Verne criou com tanto detalhe e tanta curiosidade deixou-me rendida. Apesar de todas as menções (por vezes algo fatídicas) de grandes nomes da literatura, jornalismo, música, entre outros (muitos dos quais infelizmente não reconheço) tudo empalidece quando viajamos pelas ruas de Paris na companhia de Dufrénoy.
Quanto à personagens, confesso que não desgostei de nenhuma em particular. Jules Verne alicercou-se um pouco em estereótipos (o sonhador, o trabalhador, o calculista, o conformado, a bela donzela) mas a verdade é que se nota algo mais nas personagens. Pena é que Jules Verne não o explora, focando-se no mundo e dessa forma despindo as personagens de algo que as destaque. Nesse contexto são certamente dos pontos mais fracos do livro.
A escrita do autor é bastante directa mas suficientemente rica para nos imergir na Paris do século XX que o autor tão bem imaginou. Já em termos de história, como mencionado acima, deixa um pouco a desejar, mas essa é uma questão de estrutura e não narrativa.
Os diálogos são muito 'literários', talvez mesmo pouco naturais, mas se tivermos em conta que tal deveria ser comum na época em que este livro foi escrito, torna-se aceitável. Talvez Jules Verne não tenha percepcionado de forma tão marcada que também a língua, assim como o mundo, evoluem por vezes muito rapidamente. Ainda assim, não são diálogos incómodos e chatos, apenas ... formais.
Também deixo uma nota para a introdução de Richard Howard que é interessante na forma como apresenta o autor, a sua obra e o contexto histórico em que este livro se insere. Ainda assim, pareceu-me algo morosa. Talvez se fosse um pouco mais sucinta, fosse ainda mais interessante.
Em suma, este é um livro que gostei de escutar (pois 'li-o' em formato audiobook) e que me deixou o interesse para ler mais do autor (tenho três livros dele em casa). A Paris que visitamos nesta história é distópica, mas não deixa de ser bela e é sempre impressionante perceber que este livro foi escrito à quase 150 anos atrás. Um autor a revisitar mas que, pelo menos neste livro, poderia ter incutido um pouco mais de singularidade às personagens e à trama.
Nunca tinha lido nada da autoria de Jules Verne (mais conhecido por cá como Júlio Verne), embora como quase toda a gente conheça o seu trabalho, seja por filmes (reais e animados) seja pela influência que os seus trabalhos tiveram noutras artes e que se vêem um pouco por todo o lado.
Daí que tenha partido para esta leitura ignorante do estilo do autor, se bem que consciente da genialidade do mesmo.
Em termos narrativos posso dizer que a história nada tem de especial. O enredo é simples e sem grandes acontecimentos, além de a trama estar contada num tom algo plácido que cria um distanciamento entre o leitor e a acção (por pouca que esta seja). Temos um comum sonhador, um poeta num futuro em que as letras estão mortas e os artistas morrem de fome.
Não posso no entanto dizer que a história em si é desprovida de interesse, pois são os acontecimentos que permitem ao leitor ver o mundo que Jules Verne imaginou.
Pessoalmente fiquei surpreendida com o final, não por ser inesperado, mas porque em parte não acreditava que o autor fosse por esse caminho.
Por outro lado o mundo que o autor nos apresenta é rico em detalhes, pensado ao pormenor e estranhamente verossímil. Jules Verne pode ter-se baseado nas descobertas do seu tempo para criar este futuro distópico em que as artes mirram frente ao progresso industrial, mas a verdade é que só uma mente brilhante poderia ter imaginado tal cenário há mais de 100 anos atrás.Muitos poderão argumentar que a visão futurista do autor nada tem a ver com a realidade de hoje, mas será essa a verdade? A indústria não cresce de forma exponencial? O que se faz hoje em dia sem recurso à energia (eléctrica ou outra)? As cidades não se estendem até ao infinito, quase sem o vislumbre da natureza? Não temos nós alguns dos Invernos mais rigorosos dos últimos séculos e não estão as pessoas mais preocupadas com os lucros do que com as artes?
Em muitos pontos a visão de Jules Verne falhou (a literatura não só não desapareceu, como está cada vez mais abrangente e chega a todo o lado), mas talvez na altura em que escreveu o livro (1863) as perspectivas não fossem muito animadoras aos olhos do autor.
O mundo que Jules Verne criou com tanto detalhe e tanta curiosidade deixou-me rendida. Apesar de todas as menções (por vezes algo fatídicas) de grandes nomes da literatura, jornalismo, música, entre outros (muitos dos quais infelizmente não reconheço) tudo empalidece quando viajamos pelas ruas de Paris na companhia de Dufrénoy.
Quanto à personagens, confesso que não desgostei de nenhuma em particular. Jules Verne alicercou-se um pouco em estereótipos (o sonhador, o trabalhador, o calculista, o conformado, a bela donzela) mas a verdade é que se nota algo mais nas personagens. Pena é que Jules Verne não o explora, focando-se no mundo e dessa forma despindo as personagens de algo que as destaque. Nesse contexto são certamente dos pontos mais fracos do livro.
A escrita do autor é bastante directa mas suficientemente rica para nos imergir na Paris do século XX que o autor tão bem imaginou. Já em termos de história, como mencionado acima, deixa um pouco a desejar, mas essa é uma questão de estrutura e não narrativa.
Os diálogos são muito 'literários', talvez mesmo pouco naturais, mas se tivermos em conta que tal deveria ser comum na época em que este livro foi escrito, torna-se aceitável. Talvez Jules Verne não tenha percepcionado de forma tão marcada que também a língua, assim como o mundo, evoluem por vezes muito rapidamente. Ainda assim, não são diálogos incómodos e chatos, apenas ... formais.
Também deixo uma nota para a introdução de Richard Howard que é interessante na forma como apresenta o autor, a sua obra e o contexto histórico em que este livro se insere. Ainda assim, pareceu-me algo morosa. Talvez se fosse um pouco mais sucinta, fosse ainda mais interessante.
Em suma, este é um livro que gostei de escutar (pois 'li-o' em formato audiobook) e que me deixou o interesse para ler mais do autor (tenho três livros dele em casa). A Paris que visitamos nesta história é distópica, mas não deixa de ser bela e é sempre impressionante perceber que este livro foi escrito à quase 150 anos atrás. Um autor a revisitar mas que, pelo menos neste livro, poderia ter incutido um pouco mais de singularidade às personagens e à trama.
Narração Audiobook (Bill Wallace):
Posso dizer que uma boa parte do meu entusiasmo com este livro se deveu a este senhor (Bill Wallace). Este narrador soube dar vida às ruas de Paris e até mesmo às personagens. Com uma excelente entoação e dicção, é um gosto escutar este narrador a ler com paixão e respeito o livro de Jules Verne.
Para terminar tenho de mencionar as notas finais (que devem advir da edição em papel) que estão exemplarmente completas. Um trabalho assim dá gosto e é apreciada mesmo que não lhe demos qualquer seguimento.
Para terminar tenho de mencionar as notas finais (que devem advir da edição em papel) que estão exemplarmente completas. Um trabalho assim dá gosto e é apreciada mesmo que não lhe demos qualquer seguimento.
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Um dia ainda hei de ler Jules Verne... gostaria muito de ver de ver o "worldbuilding" que elogias. :)
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