terça-feira, 24 de julho de 2012

O teu rosto será o último

"O teu rosto será o último", de João Ricardo Pedro (Edições Leya)


Sinopse:
Tudo começa com um homem saindo de casa, armado, numa madrugada fria. Mas do que o move só saberemos quase no fim, por uma carta escrita de outro continente. Ou talvez nem aí. Parece, afinal, mais importante a história do doutor Augusto Mendes, o médico que o tratou quarenta anos antes, quando lho levaram ao consultório muito ferido. Ou do seu filho António, que fez duas comissões em África e conheceu a madrinha de guerra numa livraria. Ou mesmo do neto, Duarte, que um dia andou de bicicleta todo nu. Através de episódios aparentemente autónomos - e tendo como ponto de partida a Revolução de 1974 -, este romance constrói a história de uma família marcada pelos longos anos de ditadura, pela repressão política, pela guerra colonial. Duarte, cuja infância se desenrola já sob os auspícios de Abril, cresce envolto nessas memórias alheias - muitas vezes traumáticas, muitas vezes obscuras - que formam uma espécie de trama onde um qualquer segredo se esconde. Dotado de enorme talento, pianista precoce e prodigioso, afigura-se como o elemento capaz de suscitar todas as esperanças. Mas terá a sua arte essa capacidade redentora, ou revelar-se-á, ela própria, lugar propício a novos e inesperados conflitos?

Opinião:
Com tanta azáfama em torno deste livro, a curiosidade até estava aguçada. Afinal um livro que vai já na 4ª ou 5ª edição desde o seu lançamento (2-3 meses), em Portugal, é algo que não se vê todos os dias.
No entanto, para mim, este foi um livro que acaba por não ser mau e que no entanto também não é bom. Mas vamos por partes.

A história tem vários pontos de interesse, passando-se em várias épocas mais ou menos recentes da história do nosso pais. Apesar de não ser cronologicamente precisa na maior parte do tempo, ou seja, não especifica em que período uma determinada cena ocorre, alguns dos eventos verídicos que nos são relatados são facilmente identificáveis e o autor incorporou-os bem nas cenas e nas personagens.
Infelizmente, para aquele que pretendia ser, julgo eu, o relato da vida de uma família e dos que os rodeiam, acabou por se tornar mais uma história sobre os que os rodeiam e muito pouco sobre a família em si.
Enquanto que somos apresentados a uma panóplia de pormenores sobre a vida de personagens que desaparecem em três ou quatro páginas, de Duarte e seus pais pouco sabemos.
E apesar de ter gostado do facto de o autor não desvendar todo o mistério por inteiro no final, a verdade é que, infelizmente, tudo ficou por desvendar. Há mistérios em que o autor faz do leitor um 'burro' (perdoem-me a expressão) e lhe diz tudo, até o óbvio. Aqui passa-se um pouco o contrário. O autor não nos dá pistas quase nenhumas, e certamente não dá suficientes para desvendar o mistério, mas assume que o leitor o desvendará. Ou será que fui só eu que não percebi o porquê da loucura do pai de Duarte?

No respeitante à personagens, confesso que gostei de algumas e gostaria de ter visto mais desenvolvimento da maioria. Mas o suposto protagonista, Duarte, foi tão pouco desenvolvido que cheguei ao fim da leitura sem o compreender ou simpatizar com ele, tal como aconteceu com o seu pai e com a sua mãe (e o que lhe aconteceu surgiu, literalmente, do nada). Assim fiquei com a sensação de que conheci mais as personagens que só apareceram num capítulo do que aquele que, supostamente, acompanhei o livro todo.

Voltando-me agora para o estilo de escrita, este livro é aquele tipo de literatura que gosta de ser muito bonita e limada mas que no fim está tão alisada que perde alguma consistência. Apesar de reconhecer o estilo do autor ao longo de toda a obra, a verdade é que ele tentou tantos artifícios narrativos diferentes que chegou a ser um exagero. Muitos momentos houve em que senti que estava a ser uma lista e não um romance (e não me refiro apenas ao 1º capítulo da 5ª parte, que apesar de me ter aborrecido, acabou por ser de certa forma compreendido, visto o estado emocional da personagem).
Outra coisa da qual não gostei especialmente foi o uso de palavrões que apareciam de repente no meio do texto sem qualquer lógica que não fosse só para dizer algo badalhoco. De repente, numa personagem que nunca antes mostrara sinais de dizer palavrões: Pumba! Lá vinha um, sem mais nem menos.
Apesar disso gostei de vários momentos do livro e tenho vários excertos assinalados.

No geral este foi um livro que, apesar de estar longe de ser o que gostaria que fosse tem alguns momentos bons  e outros mesmo muito bons, que no geral foi uma leitura agradável.
Gostei do final, mas achei-o demasiado aberto e para quem gosta de finais abertos, como é o meu caso, julgo que isso diz tudo.
Se o autor decidir publicar outro romance, talvez o leia, mas este não é um livro que eu possa dizer que recomendaria a qualquer um.
Capa (Rui Garrido), Design e Edição:
Evocando, a imagem da capa, um momento particularmente peculiar do livro, posso dizer que está bem conseguida, embora quase toda a capa seja engolida pelo título não deixa de ser apelativa.
O design interior é do mais simples que se pode esperar e, sinceramente, queria um pouco mais. Acho que tornaria a edição um pouco mais apelativa e única (mas isso em todos os livros, não só neste). E não tendo notado gralhas na edição, nesse aspecto nada tenho a apontar.

Links Relacionados: "O teu Rosto será o último na Wook - Wook Ebook - "O teu rosto será o último" no Facebook - "O teu rosto será o último" no Ler Mais, Ler Melhor 

Booktrailer:
O Teu Rosto Será o Último - www.wook.pt

2 comentários:

  1. Sabes Ana eu percebo a tua perspectiva e pessoalmente acho que também percebo a do autor (embora possa ter exagerado). Se tivesse de resumir diria que ele quis representar factos que, de uma ou outra forma, podem marcar uma família tendo em conta a sociedade nacional e a sua história. O pai do Duarte, em relação ao seu problema, é trauma pós-guerra (bastante mais comum do que se julga). A mãe tu sabes, (e aqui pessoalmente gostei bastante da cadência do 1.º capítulo pois visa criar impacto para a cena seguinte e consegue) o amigo de infância acho que serve para demonstrar um lado social que é esquecido, etc.. :)

    Boas leituras.

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    Respostas
    1. Elphaba, claro. Eu também respeito a opinião dos outros e não poso negar que às vezes um livro só não é adequado para aquele momento na vida de um leitor. E mesmo assim não nego que gostei de várias partes do livro e, no geral, apreciei o livro inteiro, mas vi-lhe demasiadas coisas que desgostei.
      Mas ainda bem que tu gostaste. :)

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